quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Luz, camera e ação!


Escrito por Vanessa de A. Souza

Quem dera a vida fosse um filme. Um romance farofa, como tantos de Hollywood. Eu patinando no Central Park. De bochechas rosadas. Cabelos soltos aos vento. E nada de luz verde. Luz verde é luz bruxa. Ação!, grita o diretor. Começa a trilha sonora. Pianos, adoro o som de pianos. Bailo no ritmo da melodia. Abro os braços e giro. Sim. Sim! SIM! Finalmente ele surge. Que homem lindo! Que boca! Que corpo! Ele olhou para mim. Não é possível! Ou é? O meu coração papita. Estou amando. EU ESTOU AMANDO. Mas como assim, amando? Não posso estar amando. É a primeira vez que eu o vejo. Não acredito em amor à primeira vista. Só que isso é um filme. E os filmes são curtos. Editados. Funcionais. Funcionais! Por isso funcionou tão rápido. Posso sentir a paixão. Paixão fulminante. Fuzilante. Minhas pernas estão bambas. Minhas mãos estão suando. Meu coração... Vou chamá-lo de meu coração. Forever, you and I. I and You. But... 
Quem é esse ser anatomicamente perfeito que abala todas as minhas estruturas? Qual a sua função na trama? Será o Mocinho? Ou será o Bandido? Olhos vidrados. Atentos. Preciso investigá-lo antes de... Antes de... Antes de me derreter completamente. Tarde demais! Ele está se aproximando. Acenou para mim. E sorriu. E seu sorriso não me deixa escolhas. Sim, meu amor, mãos ao alto, eu me rendo. Hipnotizada, o meu corpo arde no gelo. E as perguntas ficam no ar, completamente sem responsta. Mas Mulher!!! Você está no Central Park. E está frio. Muito, muito, muito frio! Seu coração é um gelo, então: apaga esse fogo e seja racional! R-A-C-I-O-N-A-L-!-!-! Isso mesmo, com muitas exclamações para dar ênfase. Ênfase! Ênfase? Mas pra quê? Respiro fundo e percebo que a trilha agora é alegrinha e cantada. Bon Jovi. Amo Bon Jovi. Sim, sou a mais piega das mulheres. E ouço a mais piega das músicas. Mas e daí? O meu coração já está em clima de Happy End. Afinal, ele está muito próximo. E vai dizer alguma coisa. Ele diz "oi". Eu penso "que oi sonoro". Ele percebe o meu interesse. E me beija. Ou melhor, nós nos beijamos. Sinto os seus lábios molhados, sua boca gulosa, seu hálito de tutti-fruit. Sinto também um arrepio. Afasto o meu rosto e nós nos encaramos quase que enfeitiçados. Qual é o seu nome?, pergunto eu, curiosa. 
Depois de uma pausa, sorri ele, um sorriso misterioso. Não responde. E antes que eu possa repetir a pergunta, ele segura a minha mão. Esqueço todo e qualquer interrogatório, quero apenas viver esse momento. Mãos dadas, sorrisos largos, giramos na pista de gelo. Giramos. Giramos. Giramos. Até que ele solta a minha mão, eu perco o equilíbrio, caio. Ele tem cara de Caio. E de Fernando. E de... Mulher!!! Você está se entregando rápido demais. O filme só começou. E tudo pode acontecer. Tudo! Então, eis novamente a pergunta: Mocinho ou Bandido? Bandido ou Mocinho? Mocinho? Bandido? Mocinho ou... Chega de investigações! Isso não é um filme policial. Mesmo que ele seja vilão, pode ficar bonzinho no fim. Como eu quero que ele fique bonzinho. E que em seu primeiro ato heroíco me tire do gelo, e me beije mais uma vez. Corte seco e elipse. (...) e eu não estamos mais no Central Park. E o frio do gelo foi substituído pelo aconchego quente dos edredons. Trocamos meia dúzia de palavras... E nesse enredo, poucas palavras dizem muito... (...). O meu par romântico se chama (...). Se é vilão ou bandido, eu ainda não sei. E para ser sincera, nem me importo. Pois começa a rodar outro filme. É de conteúdo adulto. Feito sem roteiro e com diretores em cena. E nessa estória, o que vale é a improvisação. Impro-visação! Impro-visa-ção!!! Meu Deus, que improvisação. No clímax da cena, o diretor grita "Corta!". E de um hora para outra, (...) não se chama mais (...). É apenas um ator. E aquele olhar de encanto, já não me procura mais.Pergunto se há novas cenas a gravar, o diretor diz que não. Infelizmente, terei que voltar à minha vida vazia.
 PÁGINAS VAZIAS. Páginas vazias sem elipse. Sem mocinho. Sem nada. Eu até poderia escrever algo, mas... Acabou a película. Acabou o ânimo. Estou sem tela. Penso que só através das telas as palavras adquirem o seu real sentido. São realmente belas, emocionantes. Talvez por isso eu tenha a impressão de que os conflitos de cinema são mais reais - os filmes possuem tempo de duração, e assim tudo se torna mais intenso. Sinto falta desse "intenso" em minha vida. Sinto falta dos conflitos, da curva dramática. Quem dera que a vida fosse um filme... Mas a vida não é um filme. E se fosse, eu decididamente não seria uma diretora ousada. Sou o tipo que não gosta de mudanças. Que não exagera. Que não experimenta cebola frita. Que só bebe suco de laranja. E que sempre se pergunta: se isso é bom, por que devo experimentar outra coisa? Sim, sou o tipo que pára de criar no início do filme. E não responde as perguntas. E tem medo de investigar e descobrir. Prefiro a inércia à ação. Talvez eu seja desinteressante para as comédias. Ou talvez, certamente, eu seja pouco rentável à indústria Holliwoodiana. Mas talvez, quem sabe, eu possa viver um filme de vanguarda qualquer dia desses. Por hora, digo que a vida não é um filme cult. Não é um Hollywood. Nem ao menos Globo Filmes. Filmes são caros. E duram pouco comparados à vida. 
E se os filmes duram pouco... A vida é longa demais. LONGA VIDA DE PÁGINAS EM BRANCO. É, meu querido, as páginas permanecem em branco. Não consigo escrever sem você. Vivo no tédio da saudades dos pequenos curtas que vivemos. Quem vive um filme é incapaz de viver a vida. Sou incapaz de viver a vida. Incapaz. Por isso, decidi ficar aqui. Parada. E depois decidi fechar os olhos. E com os olhos fechados, puz-me a sonhar. E cá estou. Parada. Olhos fechados. Sonhando. Criando um filme sem orçamento. Cheio de efeitos especiais. Atores. Cenários. E apenas eu na platéia. Tenho apenas um pedido: (...), volta comigo a sonhar o nosso filme. Nos encontramos no Central Park.

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